Eu e Lui chegamos ao Cairo em 25 de dezembro de 1988. A noção de estar num lugar tão exótico e de ser nossa primeira vez no continente africano aguçava a imaginação e tornava menos significante o fato de ser dia de natal.
Naquela época, o presidente do Brasil era José Sarney, e o do Egito, Hosni Mubarak. Vivíamos aqui uma interminável crise econômica, com fracasso sucessivo de zil planos milagrosos, mas tb havia entusiasmo pela volta da democracia, pelo fim da censura e pelo florescimento de nossa geração de artistas, fazendo sucesso na música, cinema, teatro, TV e artes plásticas.
Não muito conscientes da situação política do Egito, estávamos ali a fim de explorar nossos antecedentes culturais.
Que grande emoção foi avistar, ao longe, da janela de nosso quarto de hotel de cadeia americana, as pirâmides, um monumento de 5 mil anos...!
Foi uma viagem-matrioska, cheia de pequenas viagens dentro dela. Por falta de reservas prévias, afinal tínhamos 20 e poucos anos, dormíamos em lugares baratos e poeirentos e acabamos num barco, literalmente “descendo o rio Nilo” (na verdade subindo, pois nos dirigíamos à sua nascente). Outra emoção-gêmea, conhecer o maior rio do mundo, nós q também tínhamos o nosso maior.
Caminhando em sentidos fluviais idênticos e sentidos políticos opostos, éramos quase egípcios e não sabíamos, mas estávamos convictos de q a visita de Napoleão à Esfinge, 200 anos antes, suplantava as recentes visitas do Papa e de Frank Sinatra ao Maracanã.
Na semana passada, comemoramos a queda de Mubarak, comentando que, finalmente, 23 anos após a nossa aventura, os egípcios merecem sua democracia e o florescimento de suas artes, e nós merecemos um pouco de glamour!